saio de casa sem direcção

Saio de casa sem direcção, mas deixo o corpo inerte no segredo da luz que nasce nos candeeiros públicos. Ela entra serena pelas frinchas das cortinas e deita-se na minha cama, a luz, ao meu lado. E toca-me. Tu entrarás também, talvez. É a espera que me seduz, e quando ela se transforma lentamente num suspiro a tua sombra cresce. Desde a creche. Desde que trocámos beijos como os esquimós, e depois ao frio nos vamos sentindo sós. Tão sós como alguém que saiu de casa, e vagueia na cidade como um lobo fugindo a coelhos carnívoros. Vais às putas? Vou, mas hoje ainda não. Saio de casa sem direcção, e tal como todas as mulheres do mundo tu és a mais bonita. Se te lembrares passa lá em casa. O meu corpo está lá. Está lá? Sim, preciso de companhia para hoje. Não interessa o preço, quem paga não está em casa. Vagueia por aí, talvez no fundo dum copo de cerveja. Se calhar até está dentro do carro, em frente ao prédio, à espera que entres e saias. Ele adora as tuas saias. Como todas as outras são as mais minis do mundo. Talvez vagueie apenas numa mini, e ainda dê para te encontrar. Mas só à saída.Saio de casa sem direcção, e quando chegas o meu corpo está deitado. Não foi por esquecimento, juro. É que hoje apeteceu-me sair sozinho. Amarras-lhe as mãos ao ferro da cama, e a tua sombra vai-se movendo na parede. A luz que entrara vai saindo com vergonha, e o esperma que sai sabe-te a peçonha. Afinal deixei dinheiro em cima da mesa de cabeceira. O meu corpo aponta-to antes de saíres.Volto a casa sem destino. Cruzo-me contigo na porta. Acho que já te amava quando éramos crianças, só não tinha emprego nem dinheiro. Ainda estamos sós, e está frio.