sexta-feira, janeiro 05, 2007

Hard Candy (2005)

Dizer que “Hard Candy” chega a ser torturante a partir de um certo ponto é porventura o melhor elogio que posso fazer ao filme. Parece contraditório, não é? Tudo começa no ecrã com a marcação de um encontro num “chat” de conversação, cada vez mais na moda na era das novas tecnologias. Mas o espectador mais romântico pode tirar já o cavalinho da chuva, que aqui o romance é apenas o início de algo bem mais inquietante.

Este não é definitivamente um filme para primeiros ou segundos encontros amorosos, e se procura um filme para tal efeito, é melhor fugir deste. O “problema” é que o encontro é entre uma jovem de 14 anos chamada Hayley (será mesmo esse o seu nome?) e Jeff Kohlver, um fotógrafo de 32 anos, o que põe desde já o espectador numa situação desconfortável.

Como reagir a uma suposta química entre estas duas pessoas quando sabemos que é moralmente errado o que está a acontecer? Percebe-se de imediato a polémica. Mas o pior está ainda para vir… Na sua primeira longa-metragem, o realizador David Glade, responsável por alguns vídeos musicais no passado, demonstra imenso potencial, ao ponto de poder até ser comparado a Hitchcock (sim, Hitchcock!).

É certo que haverá aqui um ou outro truque de câmara mais barato típico de realizador novato, mas é um pormenor facilmente esquecido quando o impacto causado pela película é assim tão gigantesco. Glade e o argumentista Brian Nelson não se cansam de brincar com as expectativas do espectador e de o manipular através de um assombroso poder de sugestão que se encontra simplesmente negligenciado num cinema norte-americano marcado por “Saw”’s e afins (sendo Shyamalan o único impulsionador deste tipo de cinema sugestivo feito “à moda antiga”).

Ou seja, consegue fazer-nos lembrar aquilo que o Mestre fazia de forma tão brilhante – a velha expressão “playing the audience like a piano” assenta que nem uma luva aqui. Uma sequência de tortura em particular marcará o espectador que a visiona e consegue ser mais impressionante que qualquer amostragem gratuita de tripas em qualquer filme de terror recente.

“Hard Candy” é sem dúvida um jogo, um jogo intenso entre duas pessoas fascinantes e capaz de uma ambivalência emocional completamente arrasadora, ao ponto de não sabermos mais quem é a vítima e quem é o vilão. Praticamente todo o filme gira em torno destas duas personagens com apenas um par de personagens secundárias a surgirem num curtíssimo espaço de tempo. E portanto, todo o projecto poderia facilmente colapsar com a escolha dos actores que representariam estes dois papéis.

Felizmente, a decisão foi acertadíssima e o par de ilustres desconhecidos escolhido está mais que à altura da tarefa. Os elogios estão muito concentrados na jovem Ellen Page, que é de facto a revelação do ano como muitos apregoam. Mas o filme é também de Patrick Wilson (“Phantom of the Opera”, “Angels in America”), que tal como Page é também uma autêntica revelação – mesmo sendo ligeiramente mais conhecido, e consegue ajudar a conferir a uma figura repulsiva uma ambiguidade desconcertante.

Não restam dúvidas que estes dois actores têm um futuro promissor à sua frente (Wilson tem já este ano o novo filme de Todd Field, onde contracenará com a grande Kate Winslet). A actriz mais conhecida do minúsculo elenco será Sandra Oh (“Sideways”, “Grey’s Anatomy”), que aqui é a tal terceira personagem e que faz um trabalho bastante competente nos escassos minutos em que participa.

“Hard Candy” é de facto um doce difícil de engolir, sendo também difícil de esquecer e de sacudir após estar engolido. Não será certamente para todos os gostos, mas não deixa na minha modesta opinião de ser um dos grandes filmes do ano por causa disso

Site Oficial

1 Comentários:

Às segunda-feira, janeiro 08, 2007 , Anonymous Anónimo disse...

Muito bom o filme e com uma mensagem muito forte.

 

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